Diversidade na mídia não pode depender de repórteres estrelados, diz jornalista de origem vietnamita

Para Lam Thuy Vo, que vem ao Brasil para o Festival Piauí, repórteres não brancos precisam de apoio institucional

Bárbara Blum

São Paulo

A jornalista Lam Thuy Vo, que vem ao Brasil para o Festival Piauí de Jornalismo, tem um problema com o estrelismo.

Trabalhando em redações nos Estados Unidos, a profissional alemã, de pais vietnamitas, percebeu que o comando do jornal costuma ser formado por aqueles que um dia foram grandes repórteres, mas que não necessariamente se provaram grandes gestores.

Para ela, isso se torna uma questão mais grave quando jornalistas de minorias políticas, ou seja, mulheres, negros, indígenas e asiáticos, começam a pressionar por mais espaço.

A jornalista Lam Thuy Vo
A jornalista Lam Thuy Vo – Divulgação

Após viver e testemunhar ambientes em que tais grupos, principalmente os não brancos, sentiam-se pouco acolhidos no trabalho, ela passou a participar de chats em que jornalistas choravam as mágoas e se davam conselhos de como navegar num mundo profissional sucateado, mas ainda dominado pela ideia de que o grande repórter é aquele movido pelo talento, que se dedica a uma reportagem por meses.

Lam é uma das profissionais que montaram o site “The Journalists of Color Resource Guide”, um guia dedicado aos jornalistas não brancos que reúne as dicas coletadas por ela nesses chats. O conteúdo é variado e abarca temas como disparidade salarial, pedido de aumento, saúde mental e crescimento na carreira.

A sociedade está mudando, diz a jornalista, e já se tornou um grande caldeirão de culturas.

Ela dá um exemplo dos Estados Unidos e de sua crescente comunidade latina, em que muito se perde se um jornalista não fala espanhol, mas muito se ganha se ele for de origem hispânica.

Quem são os candidatos cujas vitórias nas midterms representam marcos para a diversidade nos EUA

“Se queremos usar o jornalismo como ferramenta para entender a sociedade, precisamos de uma imagem mais completa. Isso significa ter habilidades como escrita, uso de dados, investigação, mas exige entender que o acesso é uma questão cultural”, diz ela à Folha.

A defesa da diversidade nas redações não é novidade nem exclusividade de Lam.

Mas ela ressalta que, embora as instituições jornalísticas vejam um problema na falta de representatividade racial e busquem contratar mais minorias, “eles ainda ficam nas posições mais baixas”.

“Jornalistas no topo não têm ideia de como gerir, mas foram estrelas do jornalismo. Não se constrói um plano para pessoas virarem líderes.

É como você não regar uma planta, não adubar”, diz. “Hollywood é meio culpada por cultivar essa ideia de jornalista genial, mas quem tem tempo para ser esse personagem? Quando pensamos em equidade, precisamos pensar em quais caminhos estamos pavimentando para a liderança, no desenvolvimento de talento e em um plano de sucesso.”

Isso, segundo Lam, significa olhar para sistemas inteiros de trabalho, não só para indivíduos brilhantes.

“Tanto o trabalho glamuroso quanto o do dia a dia devem ser divididos igualmente entre todos”, afirma. “Oportunidades precisam ser divididas, o que, às vezes, significa ajudar as pessoas a se sentirem prontas para uma posição.”

Deixe um comentário

Carrinho de compras
Rolar para cima