Há três anos, Tiago Ricardo Ferreira é gestor de cidade no interior de SP, que ainda enfrenta problemas de acessibilidade
Tiago Ricardo Ferreira (PSD), 38, primeiro prefeito do Brasil com paralisia cerebral, costumava ser confundido com um bêbado pelas crianças, que não entendiam seu jeito de andar cambaleante, comum em algumas pessoas com a mesma deficiência.
Gestor de Campina do Monte Alegre (SP) há quase três anos, segue com seus gestos expressivos, mas agora é visto de outra maneira.
“Hoje, quando vou visitar uma escola, elas falam: ‘lá vem o prefeito!’. Isso é muito gratificante”, dizPor conta de sua condição —a paralisia cerebral é um comprometimento de parte do cérebro, que pode afetar o movimento, a fala ou o equilíbrio—, Tiago não consegue assinar papéis e escreve apenas no computador.
Provocado, o Ministério Público negou a denúncia. Ferreira diz que sempre sofreu mais preconceito dos adultos do que das crianças.
Ferreira sempre estudou em escola regular, junto com crianças sem deficiência. Ele afirma que, no começo, foi difícil. “Com o tempo melhorou, fui pegando amizade com os colegas. Naquela época, a inclusão não era tão presente como é hoje.”Como prefeito, ele acaba de fechar uma parceria com a Universidade Federal de São Carlos para dar formação continuada de educação especial aos professores da rede municipal de educação, na qual atualmente há 31 crianças com deficiência.
“Meu pai queria que eu fosse candidato a vereador, mas eu relutava, dizia que um por família para apanhar já estava bom.”
A mãe de Tiago também ocupa um cargo na prefeitura.Na segunda reunião, Tiago pediu que a cidade fosse contemplada com uma agência do Banco do Brasil ou da Caixa Econômica Federal.
As demandas estão em andamento para serem atendidas e Ferreira conversa periodicamente com o vice-presidente.No Palácio dos Bandeirantes, apesar de ter uma boa relação com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), Ferreira passou uma situação embaraçosa. Uma secretária do local acreditou que o prefeito não fosse ele, mas sim o assessor que o acompanhava.”
É possível que a secretária nunca tenha visto uma pessoa com deficiência em posição de poder.
E ainda por cima há muito capacitismo —preconceito— na política, que precisa de mais inclusão”, relata o prefeito.Segundo o TSE, na eleição de 2022, 476 pessoas com deficiência foram candidatasEntre elas, 53,78% eram pessoas com deficiência física, seguidas por indivíduos com deficiência visual, 23,52 %, e 12,7% % com deficiência auditiva.
A senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), que é tetraplégica, conheceu Tiago Ferreira no ano passado.”
É uma pessoa muito corajosa e cheia de energia de trabalho. Primeiro cidadão com deficiência que assume um cargo público em sua cidade e ele tem grandes desafios, já que Monte Alegre não conta com nenhum serviço para pessoas com deficiência e as condições das calçadas são muito ruins.
“A prefeitura informou está em fase de contratação de uma empresa especializada para a execução do plano, mas não deu prazo para o início das obras.Embora Campina do Monte Alegre (SP), com 6.057 habitantes e que vive praticamente de agricultura, seja a primeira e única cidade do país a ter um prefeito com paralisia cerebral, a administração não conta com uma secretaria específica para pessoas com deficiência.
Segundo o prefeito, isso é um erro e sua presença na política não substitui uma pasta para tratar do assunto.
Ele pretende implementar a secretaria juntamente com uma reforma administrativa, que ainda não tem prazo para acontecer.Professora da USP e ex-deputada estadual Janaína Pascoal, conheceu Ferreira em despachos na Assembleia Legislativa. A então parlamentar ficou impressionada com o fato de o político não se colocar numa posição de vítima.”Também gostei de a família dele sempre o tratar como alguém capaz de fazer aquilo que desejasse”, disse.No mínimo uma vez por semana, Ferreira vai a São Paulo e faz encontros políticos com deputados ou com o governador.
“Quem representa município pequeno precisa correr atrás, encher o saco, senão a coisa não anda”, afirma o prefeito.